quinta-feira, 22 de abril de 2010

LEN LYE (2)



Len Lye por Leticia Salim Bathomarco*

A animação independente refere-se a um esquema de trabalho no qual o artista procura ter um controle mais pessoal da obra, dedicando-se a uma experimentação com técnica alternativas de animação tais como animação direta na película, de areia, com carvão, pixilation, stop-motion, com recortes, com tintas, etc.

A Animação Independente tomou impulso real após a Segunda Guerra Mundial, apesar dos diversos trabalhos que podem ser citados no período anterior à guerra. Nos anos 60, os animadores, especialmente os do National Film Board of Canada e do Zagreb Studio (Iugoslávia), já dominavam a premiação do Oscar substituindo os então decadentes estúdios americanos.

Nascido em Christchurch, na Nova Zelândia, em 1901, Len Lye, um engenhoso artista plástico, foi um dos primeiros artistas modernistas de seu país. Foi atraído para a arte moderna por seu entusiasmo em criar novas formas. Lye foi um exemplo de um artista completo, era cineasta, pintor, escultor e escritor.

Foi um dos primeiros escultores do mundo a trabalhar com escultura cinética. Devido à sua grande experiência foi capaz de olhar a arte através de um ângulo incomum. Quando jovem, estudou na escola de arte e pesquisou sobre os habitantes indígenas da Nova Zelândia.

Nos anos 20, passou vários anos de sua vida na Austrália e nas ilhas do Pacífico Sul. Estudou rituais de dança da Polinésia e dos aborígines australianos.
Quando ainda estudava na escola de artes, Lye definiu seu rumo artístico como uma busca pela criação artificial do movimento comparada à composição musical.
Fosse com seus filmes ou com suas esculturas cinéticas, Lye queria explorar o movimento acima de tudo, ignorando limites entre pintura, cinema, escultura, música e gravura.

Seu primeiro filme Tusulava (1929) é uma animação experimental pioneira, semi-abstrata que retrata o princípio da vida orgânica na Terra. Foi construído com uma técnica chamada “animação tradicional” ou “cel animation”, que consiste na animação de desenhos (no caso, cerca de 4400) feitos em celulóide, em que cada quadro é desenhado à mão e depois fotografado. Teve influências das artes modernistas, aborígines e samoanos. O filme era tão “estranho” a que a Câmara de Censura da Inglaterra daquela época quase o proibiu por achar que se tratava de um filme sobre sexo. Tecnicamente falando, esse filme ainda usava a animação 2D tradicional, mas sua visualidade já demonstrava que Lye não era um animador comum. Além da clara influência da arte Maori e do modernismo, o filme também mostra que Lye tinha extremo domínio do movimento e do timing.

Seu segundo filme “A Colour Box” (A Caixa de Cores-1935) é uma série de pontos impressos e manchas de coloridas.Um show de luzes na cor pintado diretamente sobre a celulóide, em movimento com o ritmo da trilha sonora de jazz snazzy. Foi exibido em cinemas de toda a Inglaterra através da rede de salas Granada, e era uma propaganda para o General Post Office Unit (ou G.P.O. - órgão do governo ligado aos Correios britânicos e que produziu centenas de documentários, filmes educacionais e de propaganda usando animação). Com uma trilha sonora agitada e dançante, executada pela Orquestra Cubana de Don Baretto. O filme ganhou uma Medalha de Honra no Festival de Cinema de Bruxelas naquele ano.

Os críticos não sabiam em qual categoria classificá-lo, por isso criaram uma nova especialmente para ele. Esse já pode ser considerado o primeiro filme “direto na película”, feito com a alteração direta do rolo de filme através de arranhões, cortes, furos, impressão de texturas e padrões, pintura manual com tinta transparente e tratamento artificial da cor. Em 1935, filmes coloridos ainda eram considerados uma raridade e as técnicas industriais de processamento de filme colorido tornavam sua produção caríssima. A alternativa de Lye era barata, e de forte impacto.

Em 2005, o Festival de Cinema de Annency reuniu um painel de especialistas em animação, que incluiu o filme A caixa de Cores na sua lista das animações mais influentes do mundo.

Foi trabalhando no G.P.O. que Lye conheceu Norman McLaren, um dos maiores nomes da animação de todos os tempos, e que aprendeu com Lye a técnica que mais tarde ele exploraria até os últimos limites. Inicialmente explorado por Len Lye, e posteriormente imortalizado por seu amigo escocês Norman McLaren, a animação direto na película é uma técnica muito interessante que permite ao animador trabalhar em contato direto com a mídia final do cinema.

Dispensando o uso da câmera e trabalhando diretamente sobre o filme, o animador tem a oportunidade de se conectar com os primórdios do cinema, quando tudo era feito artesanalmente e os filmes preto-e-branco eram coloridos à mão, quadro a quadro
As grandes inovações em seus filmes vieram em 1934 e 1935, quando Lye descobriu que poderia fazer filmes desenhando diretamente na película. Ele pensou que poderia criar "puras figuras de movimento" riscando e pintando diretamente na película.
Len Ly utilizava agulhas, pedaços de serra, facas, garfos e ate mesmo pontas de flecha. Len Lye criou um efeito extraordinário usando uma série de pontas de agulha presas a uma haste de metal. A distância entre as agulhas era exatamente igual à distância entre os frames da tira do filme.Quando projetadas, as formas pareciam girar no espaço, em movimento suave e fantasmagórico. Para financiar seus filmes, Lye teve que adicionar slogans de propagandas até encontrar John Crierson, um patrocinador entusiástico.

Em Kaleidoscope (1935) mais uma vez que cores se deslocam sincronizados com a música de Don Baretto e Orquestra Cubana. O filme foi patrocinado pela Imperial Tobacco Company,por isso em determinado momento aparece na animação um cigarro “flutuando” e logo em seguida escrito as palavras “Churchhman’s cigarettes”.

The Birth of the Robot (1935) é o exemplo principal de como Lye teve muitos de seus filmes financiados através do uso de slogans publicitários. Flashes do financiador (Shell Oil)aparecem na mensagem final na tela: "As necessidades modernas - Mundo Moderno Lubrificação."

Em "Rainbow Dance" e "Trade Tattoo" Lye experimentou um novo processo de separação de cores com Technicolor. Rainbow Dance (1936) incorpora a figura humana com a dança de Rupert Doone transformada em animação surreal, em parte, um exemplo precoce da rotoscopia.

Em Swinging the Lambeth Walk (1939) revisa as mesmas técnicas usadas nos primeiros filmes, com outra experiência no movimento de cor animados, desta vez para o jazz swing ocidental.

Em 1944 Lye se mudou para Nova York e contribuiu para o cinema experimental. Muitos animadores aproveitaram a idéia de animação direta na película e usaram isso de forma diferente. Len Lye ainda influenciou muitos cineastas e vanguardistas.
Em suas obras Lye teve ele buscou a ligação entre o mundo sonoro e o visual.
A procura de uma correspondência entre os sentidos da visão e audição tem longos antecedentes, nomeadamente na relação entre as artes visuais e a música, forma artística que no modernismo inicial do século XIX é vista como arte integradora, como base de interação entre as artes para uma "obra de arte total". Esta abordagem trans-sensorial torna-se útil para a compreensão de formas de articulação entre som e imagem que jogam com uma noção de equivalência sensorial produzida por ambos os estímulos, mas que ao mesmo tempo os transcendem numa percepção unificada.

A obra de Len Lye "Free Radicals" (1958-79) serve como exemplo desse tipo de articulação de valores rítmicos e tácteis. Através de uma espécie de ‘inscrição automática’ na película por raspagem e da associação a uma música com valores rítmicos e de textura análogos define-se uma afinidade. O filme foi revisado novamente em 1979, com um corte de minutos do seu tempo de funcionamento.
Ele chamou a atenção do mestre do filme experimental, Stan Brakhage , que disse sobre o filme "É uma obra-prima inacreditável (um épico breve)”.

O animador Len Lye, que usava uma simples serra de madeira para rabiscar o filme 16mm, conseguindo efeitos que até hoje são confundidos com animação por computador,morreu em 1980, em Nova York. Seu trabalho continua atual e influenciando artistas das mais diversas áreas como escultura cinética e animação experimental.

Filmografia:
• Tusalava, 1929
• Colour Box, 1935
• Kaleidoscope, 1935
• Birth of Robot, 1936
• Rainbow Dance, 1936
• Trade Tattoo, 1937
• N. or N.W., 1937
• Colour Flight, 1938
• Swinging the Lambeth Walk, 1939
• Musical Poster #1, 1940
• When the Pie was Opened, 1941
• Kill or be Killed, 1942
• Cameramen at War, 1943
• Color Cry, 1952
• Rhythm, 1957
• Free Radicals, 1958 revisado em 1979
• Particles in Space, 1957
• Tal Farlow, 1980


Referências Bibliográficas

LACENA, Alberto Junior. A Arte da animação: Técnica e Estética através da Historia. 2.ed. São Paulo,Senac,2005

CAMPOS, Jorge. Len Lye - Tocar Movimento-Catálogo:A Odisséia das Imagens, vol.II, Porto (Portugal), 2001, pp.173-177.

Sites:
http://www.awn.com/ (Animation World Network)
http://www.acmi.net.au/ (ACMI - Australian Centre for the Moving Image)
www.animationmeat.com


Leticia Salim Bathomarco, 25 anos, aluna do 1 periodo do curso de Cinema e Video da UNA

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bacana!!!! Parabéns pelo artigo.