segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Pela Ordem Visível das Pessoas



por Luciene Silva Araujo*

“As histórias que gosto de contar são sempre simples, acerca de pessoas que conheci. Umas ainda vivem, outras já morreram. Tiveram vidas anônimas ou ignoradas, passaram despercebidas por este mundo e rapidamente foram esquecidas. Interessam-me os mistérios, os pequenos dramas e a poesia que se escondem nas suas vidas aparentemente banais. São elas os meus heróis e as minhas referências. (PESSOA, 2005)

“História Trágica com Final Feliz”, curta-metragem de Regina Pessoa é uma destas formas de nos fazer defrontar com espelhos trágicos da nossa própria memória de solidão, medo e melancolia. Apesar disso, o filme é criador de novas possibilidades que provocam outro tipo de emoção doada pela poética do filme de animação, que dá alma, vida e existência as coisas e aos corpos inanimados.

Há dois aspectos singulares e valiosos nesta animação: um é a soma de energia humana depositada pela artista em cada traço, desenho e movimento; o outro é a força da história contada por pessoas que, diariamente, não são vistas e que a artista escolheu retirá-las das sombras e colocá-las na ordem visível das coisas.

Pensar que as pessoas como a menina-personagem de “História Trágica com Final Feliz” foram despercebidas pelas sociedades por anos, décadas e séculos e em poucos minutos, através de desenhos em gravuras puderam dizer-se ao mundo.

É imperativa a relevância do cinema de animação neste tempo. Situado no contexto das transformações da própria cultura cinematográfica, que privilegiou formatos e práticas hegemônicas de se fazer cinema e provocou o detrimento de outras formas fílmicas a exemplo do curta-metragem animado, em especial o de autor.

O processo de animação contrapõe a lógica do tempo industrial e alienante. Exige esforço laboroso e criativo. Regina Pessoa trabalhou três anos e meio em uma história materializada em sete minutos e quarenta e seis segundos. A artista adaptou a técnica de serigrafia e desenvolveu outra mais pessoal em que testou os materiais usados no filme: placas de gesso, ripas de madeira, vidros, lixa grossa e tintas.

O resultado na compreensão mais sensível é vida longa ao filme de animação! Há ressonâncias e persistências que refletem a história do filme, tão significativa para uma sociedade embrutecida pelos princípios racionais da produção em “Just in Time”. O animador , desta forma, impõe pelas próprias mãos o seu fazer artesanal, humano e sua consciência estética e ética em relação ao seu cinema.

O cinema de Regina Pessoa em “História Trágica com Final Feliz” tem esta profundidade, retrata os dramas adultos que estão ali representados. A animação torna-se “séria” na perspectiva de tocar registros de uma memória infantil, no entanto busca sua significação na experiência daqueles que já experimentaram dores tão próprias ao universo de “gente grande”.

Dessa maneira, o espectador ativo do filme de animação poderá registrar, no patrimônio de suas reminiscências, a imagem da loucura como fonte da sabedoria, pois os loucos acreditam nas verdades que eles são capazes de criar para si. Uma menina que atravessa os campos em cima de uma veloz bicicleta, ao mesmo tempo em que houve bater alto o seu coração,sente o vento bater incessantemente em seu no rosto alisando seus cabelos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GRAÇA, Marina Estela. Entre o olhar e o gesto: elementos pra uma poética
da imagem animada. São Paulo: Senac São Paulo, 2006.

http://www.ciclopefilmes.com/regina-pessoa

CAMARGO, Sabrina. Um Olhar Sobre a Loucura de Foucault. CienteFico.
Ano III, v. I, Salvador, janeiro-junho 2003.

http://www.ebah.com.br/um-olhar-sobre-a-loucura-de-foucault-pdf-a13415.html

Luciene Silva Araujo, eh aluna do 1 perido do curso de cinema e video da UNA.

Um comentário:

Anônimo disse...

Simplesmente um dos curtas que mais me chamou atenção em todos os aspéctos.
Interessante esse post!

Thiago Herbert