domingo, 15 de novembro de 2009

7 MUMIA - CRÍTICAS 3











7º MUMIA – Internacional 2

Por Leonardo Amaral

Archipel, diálogo de uma cidade - Jasper Kuipers - 6'- Holanda

A câmera percorre solitária uma cidade em preto e branco opressor, cercado por uma cidade denotada por suas formas. No limite extremo dessa cidade geométrica, duas figuras humanas em gesso: um avô e um neto. Eles estão na divisa entre o que ainda sobra e o que são apenas corpos amontoados.

Van Jasper Kuipers trabalha uma situação de holocausto nesse curta-metragem holandês estruturado no diálogo de um jovem com fome que precisa se alimentar do próprio avô nesse fim dos tempos ali alarmado. É nessa transposição apocalíptica que trabalha Kuipers, o final, com o avô sendo devorado pelo neto (a fome e as necessidades humanas se sobrepõem a qualquer relação que exista), é de uma crueza que se torna ainda mais carrega pela trilha sonora pesada. O diálogo dessa cidade é esse seu limite entre a existência e não-existência, dos prédios que são somente formas e dos corpos que se acumulam no mar no qual estão sentados os dois personagens.

Planet A - Monoko Seto - 7'40"- França - 2008

Animação japonesa realizada com imagens sintetizadas em que vemos uma espécie de origem da vida, em que as moléculas, em aproximação que simula um microscópio (investimento em um plano detalhe), são originadas. Em um primeiro momento, não sabemos ao certo do que se trata aquilo que insiste em brotar e desenvolver em nossa perspectiva. A diretora Monoko Seto investe nesse movimento, explorar o micro para se chegar ao macro. Eis que nos é oferecido o todo, em tela, a água que percorre entre as formações rochosas de um planeta em formação. O filme é todo esse processo, inclusive uma espécie de documentação de sua criação com imagens geradas por meio de um computador.

Veterinário - Signe Bauname - 17'- Letonia - 2007

A liberdade espaço-temporal propiciada dentro do universo da animação dá vazão para a exploração ainda maior do sonho, de aspectos do surrealismo. Veterinário tem um inicio aparentemente clichê, em que um médico de animais dorme enquanto sonha estar a equilibrar-se em um coração que está prestes a se separar ao meio e o fazer cair. A partir desse instante, o que se vê é uma sucessão de situações estranhas que culminarão com o salvamento de vários animas.

Dentro desse universo, um cão campeão em produção de esperma, um porco assassinado por outros, cujas partes serão cortadas e jogadas dentro de um caldeirão com caldo fervente. Esse mesmo porco fará com que uma vaca tenha problemas de inflamação nas tetas e cujo pus advindo dessas será dado para comer a crianças que vomitarão em um galinheiro e farão com que uma galinha, após se alimentar dos dejetos, acabe por explodir entalada por um ovo na cloaca. A diretora da animação, Signe Baumanne, trabalha sempre nessa ordem absurda dos fatos, dentro de ótica fantástica que só ganha possibilidade graças à maneira minimalista como é criada. O estranhamento advém da forma, que, de alguma maneira, interfere diretamente no âmbito narrativo e temático.

Água Viva - Maris Brinkmanis - 10'- Letonia - 2009

Em certos momentos, Veltits parece ser um jogo de videogame, a partir do momento em que os dois pequenos cães passam a fugir de um tiranossauro criado a partir de uma água que dá vida a tudo o que tem contato no deserto que serve de cenário. Aliás, em 2-D é esse cenário, e o movimento dos personagens sempre privilegia a ação desses personagens, que, por meio de sons que lembra o de alguns árcades, nos dá a impressão de que, em certos momentos, interagimos com o curta-metragem. A animação, bastante simples, busca humor nessas situações da fuga, e joga diretamente com seus sons e seus efeitos de comicidade.

Heróis não mais - Sun Xun - 9'- China - 2008

“Se a história está prestes a mudar, devemos permitir que ela mude”, essa é uma frase de Stalin que vem ao fim desse curta-metragem chinês que fala, por meio de uma metonímia do lançamento de naves espaciais pela URSS, do período comunista na China, através de um jornal que nos apresenta os fatos como notícias diárias. “Possivelmente, no futuro, o planeta artificial soviético passará sobre a Terra de novo”. É com essa frase que o diretor SunXun termina sua animação, juntamente com a apresentação dos créditos finais em cédulas de dinheiro da China, numa revisão crítica sobre um período histórico de seu país.

SunXun constrói imagens desoladoras de sua nação, descrevendo, quase sempre em lettering na cartela, os períodos os quais referencia. Quase sempre essas frases por ele colocadas, que trazem consigo significações de medo, ausência de liberdade, em uma espécie de dialética com a imagem em cena, seja dos barcos presentes nas notas de dinheiro ou caminhões fornecedores de alimentos. Os desenhos, quase sempre explorados em sua forma, são expostos como constelações que estão sobre esse império chinês.

A periferia

A animação de Fabrizzio Bartolini é uma espécie de releitura de Os vizinhos, de Norman McLaren. Realizada no Chile, vemos de um lado uma família, que, em todos os momentos, faz barulho ao ponto de incomodar o vizinho solitário residente logo ao lado.

Mais do que exploração da forma, como o é na animação de McLaren, Bartolini procura trabalhar o som, principalmente após a batalha musical entre a vizinhança. Com intuito de tentar o insuportável sonoro, Bartolini busca no gore, em que cabeças são arrebentadas pelo mega-amplificador do vizinho solitário, a morte de seus personagens.

Leonardo Amaral
Crítico e redator da revista eletrônica Filmes Polvo. Diretor e fotógrafo de curta-metragens e membro-fundador da Produtora de cinema Sorvete Filmes.

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